Textos

Lavínia

No balanço do bonde gaiola adormeceu. Em um sacolejo maior abriu os olhos e tentou reconhecer quantas paradas faltavam para chegar ao colégio. Tentou lembrar da matéria para a prova de hoje, mas não conseguia nem sequer recordar o horário da prova. Será que estava preparada? Lavínia iria conseguir sentar ao seu lado e passar a cola se necessitasse? Aonde estava Lavínia?

Abriu os olhos e a rua em nada parecia familiar. Pequenos edífícios, a Igreja de pedra, a confeitaria, desconhecidas, a colocaram em pânico. Olhou ao entorno, percebendo a praça cheia de grandes árvores em flor, a casa de flores, o parquinho a as barulhentas crianças a girar em seus brinquedos coloridos, local que certamente jamais fizera parte do seu caminho. Tentou levantar-se, mas o corpo não respondia, parecia colada ao velho banco de madeira. Aonde estava sua pasta? Levou a mão ao colo, na esperança de encontrá-la. Olhou para o chão ao seu lado procurando-a e novamente assustou-se. O chão também não lhe parecia familiar. Sentiu o deslocamento de alguma coisa no rosto, levou a mão o mais rápido que pode e então pegou os óculos que caíam. A quem pertenceriam os óculos? Aproximou-os do rosto achando esquisito o grosso aro preto, as grossas lentes, sem conseguir ver detalhes.

Colocou-os e a visão melhorou. Perdida em tantas estranhezas sequer percebeu o rapaz barbudo que dela se aproximara. Viu apenas os sapatos brancos na sua frente e, elevando rapidamente os olhos, um jovem, com um grande sorriso, estendia-lhe gentilmente a mão dizendo estar na hora de ir para casa comer uma papinha gostosa e fazer um bom soninho. O rapaz fez força para a erguer, colocando após uma bengala negra, com um bonito cabo de flor, em suas mãos. A bengala da vó Candinha, reconheceu.
- Vá à merda, pensou em lhe dizer, mas a mãe certamente a poria de castigo, não deixando que fosse brincar com Lavínia. Resignada, o acompanhou.