O teatro de Porto Alegre tem sido profícuo em adaptações de textos clássicos, com freqüentes montagens de Shakespeare, dos dramaturgos gregos, algo de Tchekóv e até um recente Platão. Este resgate, que pode muitas vezes ser visto como sinal de academicismo e distanciar o público médio do teatro, também é capaz de demonstrar a vitalidade de textos centenários que, em cena, mostram-se mais atuais do que nunca.
Esse é o caso da montagem do Grupo Farsa para “O Avarento”, texto de Moliére escrito no longínquo ano de 1668 e que conta a história de um velho sovina incapaz de cultivar sentimento por qualquer outro bem que não suas 10 mil moedas de ouro. A história começa quando os filhos do “velhaco” se mostram apaixonados por pessoas simples, com quem o pai jamais consentiria que se casassem, e entre encontros e desencontros mil artimanhas são traçadas para que os enamorados concretizem seu verdadeiro amor.
A montagem, contemplada com o Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz/2008, marca o início da trilogia "As três Batidas de Moliére", idealizada pelo Grupo Farsa, que há seis anos pesquisa essa linguagem cômica. Com direção de Gilberto Fonseca, os atores Elison Couto, Lúcia Bendati, Zé Mário Storino, Marcos Chaves, Daiane Oliveira, Lucas Krug, Ariane Guerra e João Pedro Madureira encarnam com sucesso as personagens-tipo de Moliére, conseguindo trazer para a forma, para os trejeitos, muito da graça e do riso solto que o texto já não conseguiria por si só.
Um detalhe do figurino de Harpagão, muito bem interpretado pelo versátil Elison Couto, mostra o cuidado do grupo na composição das personagens e do cenário: o adesivo que prende as hastes de seus óculos. Não há referência à demonstração tão cabal de sovinismo no texto, mas o pequeno detalhe decerto é fundamental para o público reconhecer as personagens, assim como os dois leques que a personagem de Lúcia Bendati carrega e os seios apertados que as mulheres ostentam.
Em cena, os atores retomam o formato clássico, ilustrando a encenação com músicas e respeitando o enredo original, que aliás traz um conflito bastante atual numa sociedade em que a ambição e, mais do que isso, a obstinação das elites por manterem suas moedas de ouro é crescente. Harpagão, nesse sentido, é uma caricatura não apenas do ávaro, mas também do ambicioso que utiliza de quaisquer meios para aumentar sua fortuna. E o riso do público é, muitas vezes, o riso de si mesmo, o reconhecimento em si ou em outros de atitudes que atravessaram séculos.
A temporada de estreia de “O Avarento” vai até o dia 06 de setembro, de sexta a domingo, no Teatro de Câmara Túlio Piva, em Porto Alegre. Mas a julgar pelos aplausos entusiasmados do público ao final, haverá outras oportunidades de assistir ao grupo aqui e no interior, e já se aguarda com ansiedade a montagem da segunda peça da trilogia.
Atores Elison Couto, Lúcia Bendati, Zé Mário Storino, Marcos Chaves, Daiane Oliveira, Lucas Krug, Ariane Guerra e João Pedro Madureira
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