Todo mundo esconde um zoológico dentro de si. Ele pode até ficar fechado ao público eternamente. E ninguém nunca vai conhecer as feras que moram dentro de cada um. O risco é que se não se conhece o monstro, também não se aprende a lidar com ele! E rosnados, grunhidos, uivos, arranhões e dentadas podem fazer muito mais estragos do que se imagina! Ou não!
Max veste-se de lobo e sai bagunçando pela casa, até ser acusado de monstro e ser mandado para o quarto, sem jantar. O quarto se transforma em floresta, um oceano aparece, surge um barquinho e Max navega para longe dali. A viagem é longa, e tempos depois ele chega ao lugar onde vivem os monstros. Mas eles não conseguem assustar o menino, que logo se torna o rei de todos os monstros. E como rei, proclama a “bagunça geral”. Depois se cansa, manda os monstros para cama e fica sentindo falta de alguém que goste dele de verdade. O cheiro da comida atravessa os mares, chega ao nariz de Max e ele resolve partir. Mas os monstros não querem deixar, e ameaçam comê-lo...
O texto é simples, curto e flui como uma gostosa aventura. Apesar de não ser um poema e não estar construído com rimas, o ritmo do texto é melódico. Imprime à história um balanço que é quase de barco nas águas, singrando as marés. As palavras criam ondas e levam-nos ao encontro do desconhecido, tudo na base da brincadeira.
Os monstros que Max encontra estão atenuados pelo tom da brincadeira e pela mágica de olhar nos olhos, que é capaz de amansar muitas feras, especialmente as feras surgidas da imaginação, para preencherem o tempo de ser menino e de treinar a própria resistência. E monstro não precisa ser necessariamente feio nem assustador... pode apenas ser diferente, avantajado, e nem tão difícil de ser domesticado!
Mas é a raiva que faz surgirem os monstros. O castigo imposto a Max liberta suas feras, permite-o brincar com elas e depois voltar com segurança para o território do seu quarto, principalmente quando a comida ainda quentinha o espera. E o melhor, sem lições e sem palavras reconciliadoras mais contundentes e marcantes que o gesto de carinho e cuidado de alimentar uma criança solitária, trancada no quarto. Aliviada, certamente, por dar vazão ao seu lado sombrio.
E que tal pensar em limite, em punição, em valores éticos, em exercício do imaginário que permite que se pratique no plano da fantasia o que não queremos que se pratique no plano do real?
O livro é tão rico, como se pode ver! e sentir! e pressentir! Foi publicado originalmente em 1963, teve uma carreira de sucessos, ganhou prêmios importantes, e só agora foi traduzido para o português.
Maurice Sendak é um renomeado escritor e ilustrador americano. Nesse livro, em especial, ele trabalha com aquarela, bico de pena, pastel oleoso, etc., numa mistura que acentua ainda mais a aura mágica da fantasia que alegra os olhos, numa carinhosa meninice. Dá vontade de não largar o luxuoso livro de capa dura. Quem sabe quanto tempo pode durar uma viagem ao reino da fantasia?
SENDAK, Maurice. Onde vivem os monstros. Ilustrações do autor. Tradução de Heloisa Jahn. São Paulo, Cosac Naif, 2009. 40p.
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