E essa distância entre a chegada e a partida que é a vida? A gente ressente o repentino do aceno que já se despede sempre tão cedo. Porque há esses de almas gentis, de corações inteiros, de olhares que acolhem. Gente que, nas entrelinhas, ocupam a página inteira da vida com a vontade de ser para o mundo.
Pois o Sergio Napp foi desse raro ingrediente. No pouco tempo que tivemos para conversar sobre aquilo que tínhamos como paixão comum, aprendi com ele que literatura é antes de tudo um templo onde conversamos com aquela parte criança que nunca nos abandona. Para o Napp, segundo o compreendi, esse era o caráter sagrado da literatura.
Em 2014, o Napp me enviou um texto inédito dele. Tinha por inspiração a visão de que se poderia escrever ao público juvenil por um viés de maior espiritualidade. O título era “Uma chance para Deus”. Eu fiquei comovido ao ler o texto, porque dias antes, durante a Feira do Livro de Porto Alegre, mais precisamente no dia em que eu faria o lançamento do meu livro juvenil, o Napp me ligava do Hospital em que estava internado, pedindo desculpas por não poder ir ao meu lançamento. Ora, quantos outros conhecidos que naquele momento gozavam de plena saúde nem se importaram com aquele evento tão insignificante? Mas o Napp sabia. Mais velho, sabia antes. A gente só tem uma chance e Deus só tem a dele se os outros se importam com a gente.
Entre os e-mails que trocamos, lembro que ele escreveu: “Sou um daqueles escritores malditos que alguns até gostam, mas a maioria ignora. Não sei fazer marketing.” O Napp era assim, com essa humildade simples dos grandes corações. Com essa vontade de pertencer, mas sem empurrar ninguém.
Em nossa última conversa algumas semanas atrás, quando o visitava na CTI do Moinhos de Vento, falamos sobre essas coisas comuns da vida que, ao falarmos sobre elas, nos faz incomuns. Vi que ele ainda tinha muitas histórias que mereciam ser escritas. Ele estava pleno de histórias. Eu queria ouvi-las todas, mas já naquele momento, o Napp sabia antes.
Não posso deixar de me emocionar agora, quando retomo àquele último texto que ele me enviou e que, até onde sei, permanece inédito. Ali está retratada a sensibilidade, a bondade e esse caráter sagrado que a literatura alcança quando nos oferece a chance de conversar com a gente mesmo. Esse caráter íntegro de ser para o mundo, de ser para o outro, de ser para o longe imenso da vida. Porque o Sergio Napp era assim: um menino com pássaro ao ombro.
Nas palavras dele:
“Ele, a pedra pequenina
à sombra do cinamomo,
no fundo do casebre,
na rua vazia,
olhando atentamente
para o céu.
Era a última chance que oferecia à Deus."
Fique com Deus, Sergio Napp.
Lamento profundamente o falecimento do escritor Sérgio Napp.Nunca tive contato pessoal com ele,mas o admirava por seus escritos,sua obra.Lindo texto sobre este escritor tão querido.
Suely Braga, Osório RS 29/05/2015 - 20:48
Preencha os campos abaixo.