Sempre houve e ainda persiste pelo tempo, o fascínio fantasioso do homem comum por tudo que possa provocar susto e pavor. Mais como espectador do que como protagonista, mas assim mesmo, um fascínio que se deseja de permanência saudável e segura. É uma angústia seguida de um alterar de emoções que vão do susto ao medo.
O cinema e a literatura contribuem para deixar assolar tais sentimentos que, na maioria das vezes, suscitam inquietude. Porém o homem os aprecia e consegue dominá-los porque, afinal, é tudo imaginário e distante da sua realidade. E foi, em grande parte, através deste imaginário, que ele percorreu caminhos no exercício de vencer medos.
Por vezes, ainda como espectador, ele vai alguns passos além, preso a notícias veiculadas no jornal e TV. Se está ali sentado na sua poltrona predileta, o acontecimento, por mais horrendo que seja, lhe garante distância. Não aconteceu com ele, nem com sua família, nem com algum conhecido. Embora real, não o atinge a ponto de provocar ameaças.
Só que a vida não é assim tão dividida entre o real e o imaginário. Há um componente nisto tudo com a capacidade de tirar o prumo de qualquer um, de fechar o sujeito num beco sem saída jogando feio com múltiplas emoções não desejadas. O nome disto é incerteza.
O imprevisível acontece. Percorrer o caminho das incertezas faz a pessoa desconfiar de seus instintos e, por vezes, recuar pela ausência de chão. É penoso sentir-se travado – para onde eu vou? O que me espera no fim do túnel? Será preciso abandonar as certezas e, talvez, juntar-se a outros tantos na busca de saída – quem sabe?
Bom se pudesse voltar aos cenários conhecidos, controláveis, previamente planejados com alta possibilidade de sucesso. Mas o real e o imaginário se entrelaçaram e o surpreenderam antes de qualquer gesto de fuga. Se não dá para fazer o futuro caber num espaço confiável, talvez se precise abandonar temporariamente as certezas e seguir a intuição. Mesmo que assolem dúvidas, mesmo que não se tenha a garantia entre os cinco dedos das mãos.
Mas valerá a tentativa, se entender que as dúvidas podem ser produtivas e direcionar o rebanho todo, garantindo algo bem maior do que certezas obsessivamente controladas. É no que ele aposta, embora excluído de tal segurança – a troca será interessante e o caminho, embora desafiador, deverá trazer benefícios para a humanidade.
05/04/2020
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Comentários:
Ler JACIRA FAGUNDES é a certeza de ler um bom texto, de análise lúcida e inteligente. Enilda Alves, Porto Alegre (RS)0109/04/2020 - 19:54
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Jacira Fagundes
Jacira Fagundes é professora e escritora. A trajetória literária, encarada como ofício, teve começo em 2002, com a premiação do conto “Noite fria de vigília”, quando do lançamento do Prêmio Literário Nova Prova – 20 anos. Ficou entre os quinze autores selecionados e seu texto foi publicado em obra da Editora.
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