Quando comecei a pensar sobre a mensagem de final ano, ao me dar conta de que dezembro chegara (e se esvairia rapidamente), lembrei de todas as profecias e das bilheterias holywoodianas provocadas pela expectativa em torno do próximo ano. E não pude deixar de pensar na música do Paulinho Moska Último Dia,que provoca: “o que você faria se só te restasse um dia?”
Há tempos atrás, quando a sorte e/ou o acaso livrou a mim e a um colega de estarmos naquele trágico vôo da Tam eu postei a letra da música num blog que mantinha. Alguns conhecidos e amigos responderam com reflexões, medos e alegrias. Um amigo virtual lembrou do livro de Tchekov que prometera me emprestar, uma amiga estava às voltas com o início de uma paixão que virou casamento e uma menina linda e outros apenas manifestarão indignação com o acidente. Mas todas as respostas deixaram a clara impressão de que, no limite do tempo, as decisões não versam sobre coisas grandiosas. Aliás, talvez haja momentos em que não cabe decidir.
O ano voa com a rapidez que nem sempre encontramos no andar atribulado das horas. Seguimos uma rotina de planos e postergações. Então, dezembro acaba e costumamos fazer as famosas promessas de ano novo. Longas listas do que achamos que devemos / precisamos fazer, mas que, sistematicamente, vamos ignorar ao longo dos próximos 12 meses.
Eu, por vezes, adoto aquela máxima “no creo en las brujas, pero que las hay, las hay....” então, convido a pensar, não sob o ponto de vista fatalista ou catastrófico, na possibilidade do tal “fim do mundo”. Tomemos essa possibilidade como ponto de partida para uma reflexão adulta e serena sobre como responderíamos à pergunta da música, considerando que temos, ao invés de um único dia, 12 meses pela frente.
Abrir a porta do hospício? entrar de roupa no mar? esquecer que não dá tempo? que perdemos tempo demais ? ou que a cada momento temos a possibilidade da decisão? Voto em acreditar que sim, que todas as escolhas importam e que se não é possível fazer tudo, que se faça o que importa; que não se faça, quando isso for necessário – porque nem só de ação se faz o mundo, mas também de contemplação, repouso e deriva.
Que tenhamos a alegria de sentir e aceitar que não é possível comandar o rumo o tempo todo, porque não somos onipotentes (aliás, nem creio nisso, perdoem-me os não ateus) e isso não precisa doer. Coisas acontecem no meio onde estamos inseridos sem qualquer interferência nossa e mesmo que nos afetem, isso não tem correlação direta com méritos e castigos. Então, que tal encarar isso como motor para levar os dias com mais leveza e não como fonte de angústia? Mas também para não deixar de tocar adiante aquilo que nos é caro.
Então, pensemos assim: se o mundo acabar, que tenhamos conduzido nossos dias com dignidade, sorvido com gana o gosto de existir e, se não acabar (o que considero 99,99% mais provável), que tenhamos desfrutado muitas páginas (virtuais ou impressas, não importa), ouvido muita música boa, provado bons sabores e partilhado riso com amigos sabendo que viver não é e não deve ser insípido, embora deva fluir com a mesma maleabilidade da água. E sigamos lendo, lendo muito e escrevendo todo tanto que nos seja imprescindível.
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