Literatura
“Descontágio”, de Cleo de Oliveira
Roberto Márcio Pimenta
Lançado em 2006, como Vencedor do V Prêmio Literário Livraria Asabeça Categorias Conto/Crônica, “ Descontágio”, do autor gaúcho Cleo de Oliveira é uma obra que faz por merecer um grande público leitor. É mais uma prova de que os concursos anuais de contos têm revelado grandes nomes da Literatura Brasileira tal como Dalton Trevisan, Roberto Drumonnd, João Gilberto Noll e, agora, Cleo de Oliveira. “Descontágio” é o modelo tÃpico de que literatura se faz com bom senso, talento, trabalho e, sobretudo, com muita arte. É um conjunto de contos onde o autor nos presenteia com efeitos surpreendentes numa narrativa que nos encanta, capta e nos insere num mundo fantástico. Conforme Moacyr Scliar, em sua apresentação, “Quem não conhece os contos de Cleo de Oliveira deve se preparar para uma surpresa.” “Não sabemos o que admirar mais nos contos de Cleo: se o seguro domÃnio da palavra, se a habilidade narrativa, se a sensibilidade”.
O livro é composto de quinze contos. No primeiro, “Agora Irene somos eu”, Cleo nos remete ao encontro do mundo de duas irmãs xifópagas que estão morrendo. Irene se foi. Antes que também se vá a outra irmã nos relata os pormenores de suas vidas reclusas e os encontros secretos atendendo à s fantasias eróticas do professor dinamarquês Clausen. Há um erotismo velado, sugerido pelas palavras da personagem que vai partir. A silepse no tÃtulo se justifica pela morte da irmã e a continuação das sensações no mesmo corpo.
Em “Descontágio”, conto premiado que dá nome ao livro, Cleo nos transmite a fantasia dos sonhos, o medo, as neuroses do ser humano diante do mundo televisivo, a comunicação afetando o comportamento do personagem.
“Boneca dos olhos de concha” é a magia e a menina em uma boneca sem olhos. A menina coloca conchas no lugar dos olhos da boneca e várias coisas começam a acontecer.
“Como um velocÃpede abandonado” serve como uma advertência à s pessoas que lidam com crianças. É a displicência, o descuido, o arrependimento numa narrativa impressionante que nos leva a uma reflexão.
“Depois do temporal” é mais uma narrativa do autor inserindo-se em um mundo infantil feminino: a preocupação com o vestido, a mãe, a tia, o sorvete.
Em “Ali onde os caminhos se cruzam”o personagem presencia uma briga de bandidos. Já em “Rosas da cor do cabelo” segue a mesma temática: a busca do dia-a-dia nos aspectos do cotidiano, a violência, os casos de polÃcia. Entretanto, em “Lembranças circulares”, Cleo nos deixa nÃtida a impressão sobre a morte, as pessoas que se relacionam com o morto, dentro de um processo metafórico-filosófico de vida. “Platão tinha razão” é outro conto em que consegue o mesmo resultado. Já em “Maldito coração solitário”apresenta um efeito surpreendente. Nos contos “A simetria do olhar”,”Um passeio nos sonhos”, “A lista” e “Meus amigos do lago” os personagens estão contidos na própria ação. São fragmentos do nosso dia-a-dia.
Finalmente, no desfecho, nos oferece sua obra-prima, “Uma vista para os jardins de Arlete”, onde o autor nos proporciona algo “surpreendente e notável”, conforme o próprio Moacyr Scliar revelou.
“Descontágio” é o melhor argumento contra todos aqueles que acham que a literatura brasileira da atualidade está em baixa.
27/08/2008
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