CAVALCANTI, Maria Clara. Quibungo. Ilustrações de Allan Rabelo. Rio de Janeiro, Escrita Fina, 2011. 36p.
A imaginação da gente está povoada de figuras estranhas! Em todo lugar, os seres monstruosos adquirem nomes e formas diferentes. Mas todos eles têm sempre um aspecto exagerado, grandioso, descomunal e assustador, para poder acionar o medo, porque sem temor, eles somem!
Mas, esse, em especial, chamado Quibungo, tem origem africana, e pertence ao reino dos homens-animais. Está ligado a vários povos: angola-congueses, bantos, etc. E é também associado ao lobo e aos lobisomens. Aqui, no Brasil, já misturado, virou bicho de cabeça muito grande, que tem um buraco nas costas, por onde devora as crianças que ele mesmo atira ali. E ficou bem conhecido no recôncavo baiano.
Mas essa história, que a princípio poderia ser trágica, pode acontecer de outro modo. Veja só: o menino Kunta não acreditava muito quando lhe diziam para tomar cuidado com o Quibungo. Ouvia isso desde pequenininho e sabia que era um artifício para que ele ficasse longe da floresta, do rio e dos bichos ferozes. Um dia, achando-se grande o suficiente para caçar sozinho, tomou suas armas e se aventurou nas matas. Encontrou o leopardo, o jacaré, a cobra, e para escapar de ser devorado por qualquer um desses bichos, disse sempre que estava indo encontrar-se com os filhotes do Quibungo. E ao explicar quem era esse, os animais, fugiam de medo. Até que Kunta encontra-se, cara a cara com o Quibungo. E usando da inteligência, o menino consegue conduzir o gigante peludo até à revelação final.
Mais do que medo, a história figura de modo divertido e é capaz de provoca risos. A inteligência, como de costume, é a arma dos mais fracos, aqui e nos contos populares. E Kunta, nosso herói, não precisa usar de nenhum ato violento para enganar o monstro, que nessa versão tem até olhos cor de fogo. Por conta da esperteza do menino, todos os outros monstros conhecidos do imaginário infantil brasileiro – Bicho-papão, Homem do saco, Tutu Marambá, etc., ficaram para sempre escondidos no escuro das florestas, com medo do confronto com meninos e meninas espertalhões. Com isso, as crianças ficaram pra sempre livres desses encontros atemorizantes! Mas não na fantasia!
O texto flui que é uma maravilha. E o leitor fica torcendo mesmo para o pequeno herói, que é valente, ousado e divertido. A música que o menino canta, também funciona como uma trova rimada, e é usada várias vezes ao longo da história, o que acaba por imprimir à narrativa uma leveza e um colorido especiais. E sem querer, o leitor memoriza a quadrinha e vai cantando junto também!
O texto enxuto, bem distribuído, com tipologia grande e em diálogo ininterrupto com as ilustrações, de grossos riscos pretos, como a imitar traços de carvão ou crayon (ou largas pinceladas de nanquim), faz sobressair o colorido (ainda que mecânico) dos verdes, vermelhos (ou laranjas?) e amarelos das páginas de fundo branco. Esse “jogo” dá um charme especial ao livro.
O ilustrador, também designer gráfico, e a autora, experiente contadora de histórias e com grande domínio da oralidade, criaram juntos uma obra que convida a contar e a cantar em voz alta. Quem resistirá?
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